
Ao navegarmos na internet, podemos encontrar com facilidade argumentações de pessoas que têm dificuldades em aceitar a concepção trinitariana da Divindade. Afirmam com segurança que essa doutrina tem suas origens no paganismo e que foi “cristianizada” pelo papado. E, infelizmente, muitos adventistas também creem assim, chegando a suspeitar que a adoção dessa crença pelo adventismo pudesse representar o tão temido “ômega” da apostasia mortal antecipada por Ellen White.
Assim, essas pessoas apelam aos outros irmãos adventistas para que tratem o tema com a seriedade e a imparcialidade dos “bereanos nobres” de mente aberta, mencionados no livro de Atos — homens que “receberam a palavra com toda avidez, examinando as Escrituras todos os dias para ver se as coisas eram, de fato, assim” (Atos 17:11).
Pois bem, de acordo com esse mesmo espírito dos bereanos, neste artigo buscaremos oferecer uma resposta clara, direta e fundamentada nas Escrituras para as seguintes questões:
1. Existe, de fato, evidência bíblica suficiente que sustente as alegações trinitarianas aceitas pela ampla maioria da tradição cristã e pelo adventismo contemporâneo — ao menos a ponto de justificar uma consideração séria de tais reivindicações?
2. Ou será que as provas são tão escassas que nos levam a crer que a doutrina da Trindade realmente não passa de um engenhoso engano, uma adaptação cristianizada de antigas ideias politeístas, “batizada” pelo cristianismo apóstata e, mais tarde, inadvertidamente absorvida pelos adventistas?
O convite que faço ao leitor é simples: acompanhe atentamente as linhas de argumentação que seguem e, ao final, reflita honestamente — as evidências apresentadas bastam para considerar plausível a doutrina da Trindade?
Meu propósito não é impor uma conclusão goela abaixo, mas abrir caminho para uma análise séria e espiritual. Tudo o que peço é que você, com oração e mente receptiva, avalie se há motivos suficientes para continuar estudando o tema com profundidade e devoção.
Para tanto, convido-o a imaginar-se como um candidato ao batismo, participando de aulas preparatórias com o pastor da igreja. Nesse contexto, o ministro busca apresentar-lhe as melhores provas bíblicas em favor da crença trinitariana. São três as questões fundamentais que servem de base para essa investigação:
- A plena e eterna divindade de Cristo;
- A personalidade e a completa divindade do Espírito Santo;
- A unidade de natureza e caráter das três pessoas que compõem a Divindade.
Esclarecimentos preliminares
1. O que significa “natureza divina”?
Antes de mergulharmos na análise das passagens bíblicas, é necessário esclarecer o que queremos dizer quando falamos da “natureza divina” ou de algo “plenamente divino”. Cristãos sinceros, sejam trinitarianos ou antitrinitarianos, concordam que o Deus revelado nas Escrituras se distingue de todas as demais criaturas por certos atributos exclusivos, os quais o identificam como o Criador.
Por sua própria essência, Deus é:
a) Um Ser pessoal, e ainda assim presente em toda parte — onipresente (Salmos 139:7-12);
b) Conhecedor de todas as coisas — onisciente (Salmos 139:1-4);
c) Todo-poderoso — onipotente (Mateus 19:26);
d) Eterno, existente “de eternidade a eternidade” (Salmos 90:2);
e) Imutável em Seu caráter e essência (Malaquias 3:6);
f) Perfeitamente justo e bom (Salmos 145:9; 19:7-9);
g) Amor em sua expressão mais pura e desinteressada (1 João 4:8).
Se um ser não possui esses traços, não estamos falando do Deus verdadeiro revelado pela Bíblia.
2. Os nomes divinos nas Escrituras Hebraicas
O Antigo Testamento apresenta diversos nomes e títulos aplicados a Deus — “El”, “Elohim”, “Adonai” e o venerado “Yahweh”. Quando se refere ao Deus verdadeiro, qualquer desses nomes pode ser usado legitimamente. Entretanto, o Novo Testamento mostra que algumas dessas passagens veterotestamentárias não se referem apenas ao Pai, mas também ao Filho e ao Espírito Santo.
Portanto, expressões como “Senhor” ou “Yahweh” podem, em certos contextos, designar a totalidade da Divindade em sua unidade essencial (Deuteronômio 6:4), enquanto em outros casos aplicam-se a uma das pessoas divinas em particular.
Alguns grupos antitrinitarianos — como as Testemunhas de Jeová — restringem o nome “Senhor” (YHWH, Yahweh ou Jeová) apenas a Deus Pai. Outros, percebendo a força das evidências, tentam aplicá-lo exclusivamente ao Filho. Contudo, o testemunho bíblico, especialmente à luz do Novo Testamento, mostra que o termo “Senhor” pode, de fato, referir-se tanto ao Pai quanto ao Filho ou ao Espírito Santo, dependendo do contexto.
Em João 8:58, por exemplo, Jesus identifica a Si mesmo como o “Eu Sou” de Êxodo 3:14-15. Já em Apocalipse 4:8, o “Senhor dos Exércitos” de Isaías 6:3 é aplicado ao Pai — “aquele que era, que é e que há de vir”. Assim, o nome “Senhor” (Yahweh) não se limita a uma única pessoa, mas abrange a plenitude da Divindade.
A Plena Divindade de Jesus Cristo
A principal questão que desafiou a igreja cristã nascente foi esta: como afirmar a plena e eterna divindade de Jesus Cristo sem comprometer a convicção monoteísta herdada do judaísmo? Essa tensão entre a unidade de Deus e a divindade do Filho marcou o início de uma longa reflexão teológica que culminaria na formulação doutrinária da Trindade.
A Epístola aos Hebreus: o Cristo Superior
A Epístola aos Hebreus é, sem dúvida, um dos textos mais profundos do Novo Testamento. Dirigida a cristãos de origem judaica, ela está saturada de citações e alusões ao Antigo Testamento, exigindo do leitor familiaridade com o templo, o sacerdócio e os ritos do santuário.
Logo em seu primeiro capítulo, o autor apresenta três linhas de evidência notáveis — entre várias outras — que apontam para a identidade divina de Jesus. Ele demonstra, a partir das Escrituras hebraicas, que o Jeová do Antigo Testamento inclui, em Sua própria identidade, a pessoa de Jesus de Nazaré.
Um dos grandes propósitos dessa epístola é revelar a superioridade de Cristo sobre todas as figuras do judaísmo: anjos, Moisés e o sacerdócio levítico. Por fim, o autor mostra que o sacrifício de Cristo é infinitamente mais eficaz que os rituais repetitivos do santuário terreno — um único sacrifício, suficiente e eterno.
O primeiro capítulo estabelece a base dessa argumentação, começando pela comparação com os anjos.
Cristo é Superior aos Anjos
O autor recorda que os anjos são “espíritos ministradores, enviados para servir a favor daqueles que hão de herdar a salvação” (Hebreus 1:14). São, portanto, criaturas sublimes, mas não comparáveis em glória e dignidade ao Filho de Deus. Conclusão: Jesus é superior aos anjos.
Nos versículos 5 e 6, o autor lança uma pergunta retórica: “A qual dos anjos disse jamais: Tu és meu Filho, hoje te gerei?” E novamente: “E todos os anjos de Deus o adorem.”
A resposta é óbvia — a nenhum.
A implicação é direta: o Filho é digno de adoração, e somente Deus pode ser adorado segundo o monoteísmo veterotestamentário (Êxodo 20:2-4; Apocalipse 19:9-10; 22:8-9). Logo, Jesus é Deus, pois recebe a mesma adoração que pertence exclusivamente ao Criador.
O Filho Chamado de “Deus”
Em Hebreus 1:7-8, o contraste é ainda mais explícito: “Dos anjos diz: Dos seus anjos faz ventos, e de seus ministros labareda de fogo. Mas, do Filho, diz: O teu trono, ó Deus, é para todo o sempre.”
Aqui o autor cita o Salmo 45:6, aplicando-o diretamente a Cristo. É a primeira de sete passagens do Novo Testamento em que o termo grego Theós (Deus) é usado para se referir ao Filho (as demais estão em João 1:1, 18; 20:28; Romanos 9:5; Tito 2:13; 2 Pedro 1:1).
Para os primeiros cristãos de origem judaica, essa identificação foi surpreendente — reconhecer que Jesus podia ser invocado como Deus. E o mais notável é que o Novo Testamento não registra nenhum protesto contra essa compreensão. Pelo contrário, os apóstolos e os fiéis aceitaram-na naturalmente, à luz da revelação progressiva do plano divino.
Gramaticalmente, o texto de Hebreus 1:8 é inequívoco. A expressão “ó Deus” está no caso vocativo, ou seja, trata-se de uma invocação direta ao Filho. Assim, os autores do Novo Testamento não estão apenas sugerindo, mas afirmando de modo explícito que Jesus Cristo é Deus.
O Filho como Criador
A argumentação ganha ainda mais força nos versículos 10 a 12, quando o autor aplica ao Filho palavras do Salmo 102:25-27: “No princípio, Senhor, lançaste os fundamentos da Terra, e os céus são obra das tuas mãos.”
Aqui, o escritor repete a mesma ideia já introduzida em Hebreus 1:2 — Cristo é o Criador do universo. Esse ponto é crucial: aquilo que no Antigo Testamento é dito de Jeová, o Criador, é agora aplicado diretamente a Jesus.
E se examinarmos o próprio Salmo 102, perceberemos que ele é uma oração dirigida ao Senhor (YHWH). O termo “Senhor”, escrito em letras maiúsculas nas versões modernas, traduz o tetragrama sagrado — YHWH —, o nome pessoal de Deus, transliterado como “Jeová” ou “Yahweh”.
O que isso significa? Que o autor de Hebreus pega uma passagem endereçada a Jeová e a aplica a Jesus Cristo. O raciocínio é direto e contundente: o Deus Jeová do Antigo Testamento é o mesmo Jesus do Novo Testamento.
Essa é, sem dúvida, uma das afirmações mais poderosas da epístola e uma das evidências mais claras da plena divindade do Filho.
“Testemunhas de Jeová” e o Verdadeiro Testemunho
A força desse argumento bíblico oferece também uma resposta elegante àqueles que negam a divindade de Cristo. Quando abordado por representantes das Testemunhas de Jeová, um cristão pode responder com serenidade: “Também sou uma testemunha de Jeová — porque testifico de Jesus Cristo, que é o verdadeiro Senhor Jeová revelado no Novo Testamento.”
Assim, à luz das Escrituras, o título “Senhor Jeová” não pertence apenas a uma figura distante e transcendente, mas ao próprio Cristo, Deus manifestado em carne.
O livro de apocalipse e a plena divindade de Cristo
O livro de Apocalipse também apresenta sólidas evidências da plena divindade de Jesus Cristo, de modo muito semelhante ao que encontramos em Hebreus 1:8-12. No primeiro capítulo, particularmente nos versos 12 a 17, João descreve uma impressionante visão do Cristo glorificado, atuando como o sumo sacerdote celestial. Nesse contexto, o verso 17 merece atenção especial: Jesus dirige-Se ao profeta atônito e temeroso com as palavras — “Não temas; Eu sou o Primeiro e o Último”.
Uma breve consulta às notas de rodapé ou às referências cruzadas de qualquer Bíblia de estudo revelará que João está se apoiando diretamente em passagens do profeta Isaías — mais precisamente em Isaías 41:4, 44:6 e 48:12. Em Isaías 44:6 lemos: “Assim diz o Senhor, Rei de Israel, o seu Redentor, o Senhor dos Exércitos: Eu sou o primeiro e Eu sou o último, e além de Mim não há Deus.”
Essa conexão textual é notável. João, inspirado pelo Espírito, aplica a Jesus o mesmo título que, no Antigo Testamento, era reservado exclusivamente a YHWH (ou Jeová). Isso demonstra que o apóstolo reconhecia em Cristo a mesma identidade divina do “Senhor” proclamado por Isaías. Assim, o “Primeiro e o Último” de Isaías é o mesmo “Senhor Jesus” que domina as páginas do Apocalipse.
Curiosamente, o próprio livro de Apocalipse mostra que essa designação — “o Primeiro e o Último” — é utilizada também para Deus Pai. No capítulo 1, verso 4, Ele é apresentado como “Aquele que é, que era e que há de vir”, e no verso 8, declara: “Eu sou o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim, Aquele que é, que era e que há de vir, o Todo-Poderoso.” Quando o texto aplica títulos idênticos ao Pai e ao Filho, evidencia-se a perfeita igualdade entre ambos em natureza e essência divinas.
Essa correspondência se reforça em Apocalipse 22:12 e 13, onde se lê: “E eis que venho sem demora, e comigo está o galardão que tenho para retribuir a cada um segundo as suas obras. Eu sou o Alfa e o Ômega, o Primeiro e o Último, o Princípio e o Fim.”
Surge aqui uma questão: quem está falando — o Pai ou o Filho?
Embora o texto não identifique de imediato o interlocutor, o contexto indica que é Jesus quem profere essas palavras. Note-se que, nos versos anteriores (9 a 11), um anjo havia recusado adoração de João, deixando claro que não poderia ocupar o lugar de Deus. Logo em seguida, sem pausa evidente na narrativa, é introduzida a voz que diz: “Eis que venho sem demora.” Ora, nenhum anjo poderia reivindicar esse título divino, nem anunciar a Sua própria vinda com galardão — trata-se, indubitavelmente, de Cristo.
O verso 16 confirma a identificação: “Eu, Jesus, enviei o Meu anjo para vos testificar estas coisas.” E no verso 20, o texto sela a questão com clareza inquestionável: “Aquele que testifica estas coisas diz: Certamente, venho sem demora.” Ao que João responde: “Amém. Vem, Senhor Jesus.”
Essas passagens não deixam dúvidas quanto ao fato de que os títulos “Alfa e Ômega”, “Princípio e Fim” e “Primeiro e Último” são aplicados igualmente ao Pai e ao Filho, demonstrando que ambos compartilham a mesma natureza divina e eterna. Essas expressões, aliás, figuram entre as mais sublimes formas bíblicas de descrever a eternidade e a autoexistência de Deus — atributos que pertencem, sem distinção, tanto ao Pai quanto ao Filho.
Por fim, é significativo que, justamente no desfecho do Apocalipse, essa comunhão plena entre o Pai e o Filho alcance seu clímax. Nos capítulos 22:1 e 3, João descreve o “trono de Deus e do Cordeiro”, unindo-os como co-regentes do universo. Agora, Cristo não é mais o Cordeiro diante do trono (como visto em Apocalipse 5:6-7), mas o Cordeiro que assenta-Se com o Pai, reinando ao Seu lado. Essa imagem encerra o livro com uma poderosa declaração: Jesus é plenamente divino, eterno e digno de toda adoração — o Senhor e Criador do tempo e do universo. Portanto, Ele não pode ter sido criado em algum momento do tempo, pois Ele é Criador de tudo, inclusive do tempo, o Alfa e o Ômega, que reina para sempre com o Pai.
O evangelho de João e a eterna divindade de Cristo
Entre todos os escritos do Novo Testamento, poucos proclamam com tanta clareza e majestade a plena e eterna divindade de Jesus Cristo quanto o Evangelho de João. Desde suas primeiras linhas até o clímax de suas revelações, João exalta Cristo não apenas como o Messias, mas como o próprio Deus encarnado — o Verbo eterno que se fez carne para habitar entre nós.
Uma das declarações mais citadas a esse respeito é João 1:1, especialmente a última frase: “… e o Verbo era Deus.” Este verso, em sua estrutura gramatical e teológica, constitui uma das afirmações mais poderosas da divindade de Cristo. A análise detalhada da construção grega (“kai Theòs ên ho Lógos”) mostra que João descreve o Verbo — isto é, Jesus — não como um ser derivado, mas como plenamente divino em essência. Este texto testifica, com força e clareza, que o Verbo é Deus em Sua totalidade.
Entretanto, talvez a mais impressionante e incontroversa afirmação da divindade de Cristo no Evangelho de João esteja no capítulo 8, verso 58. Em meio a um intenso diálogo com os líderes judaicos, Jesus declara: “Em verdade, em verdade vos digo: antes que Abraão existisse, EU SOU.”
Essa frase, aparentemente simples, carrega um peso teológico imenso. A maioria dos estudiosos reconhece que Jesus está aqui evocando Êxodo 3:14 — o momento em que Deus Se revela a Moisés na sarça ardente e declara: “EU SOU O QUE SOU. Assim dirás aos filhos de Israel: EU SOU me enviou a vós.”
A aplicação dessa expressão divina a Si mesmo é, sem dúvida, uma das mais claras evidências de que Jesus Se identifica com o Deus do Êxodo — o próprio YHWH (Jeová). Ele não apenas toma para Si o título “EU SOU”, mas também reivindica ser o mesmo Deus dos patriarcas — “o Deus de Abraão, o Deus de Isaque e o Deus de Jacó” (Êxodo 3:15). Assim, Cristo não Se apresenta como um ser criado, nem como uma manifestação secundária de Deus, mas como o próprio Deus que libertou Israel do Egito e guiou Seus pais pela aliança.
Os ouvintes compreenderam perfeitamente a magnitude dessa afirmação — e reagiram com violência. O versículo seguinte (João 8:59) relata que pegaram em pedras para apedrejá-Lo. Por quê? Porque, segundo a Lei, essa era a pena para a blasfêmia — e aos olhos deles, um homem que reivindicasse ser Deus cometia justamente esse crime (ver João 5:18). O gesto deles, portanto, comprova que entenderam o sentido exato das palavras de Cristo: Ele estava reivindicando igualdade com o próprio Deus.
Alguns intérpretes modernos tentam suavizar o impacto da expressão “EU SOU”, sugerindo que Jesus apenas quis afirmar uma preexistência anterior a Abraão, e não uma existência eterna. No entanto, como observa o teólogo Max Hatton, a gramática do texto não permite essa leitura limitada: “Se Jesus houvesse pretendido dizer apenas que existia antes de Abraão, teria usado a forma Ego ên (‘Eu era’). Em vez disso, Ele diz Ego eimi (‘EU SOU’) — uma forma absoluta, sem complemento, idêntica à usada por Deus em Êxodo 3:14. Essa escolha gramatical é decisiva.”
De fato, o texto grego da Septuaginta traduz Êxodo 3:14 como Ego eimi ho ōn — “EU SOU AQUELE QUE SOU”. E o grande helenista A. T. Robertson comenta sobre João 8:58: “Indubitavelmente, aqui Jesus reivindica eterna preexistência com uma frase absoluta, utilizada exclusivamente para Deus.”
Não há, portanto, espaço para ambiguidade. Quando Jesus diz “Antes que Abraão existisse, EU SOU”, Ele não está falando apenas de anterioridade temporal — está afirmando Sua eternidade. Ele é Aquele que é, o Ser autoexistente, o mesmo que falou a Moisés do meio da sarça.
Colocando em termos simples e diretos: ou Jesus é verdadeiramente quem afirmou ser em João 8:58, ou não passaria de um homem enganado — ou ainda, o mais blasfemo da história. Não há meio-termo.
O Evangelho de João, assim, permanece como um dos testemunhos mais sublimes da divindade do Cristo eterno. Ele é o Verbo que existia com Deus desde o princípio, e que era Deus; é o “EU SOU” que transcende o tempo e a criação; o mesmo Deus que libertou Israel é Aquele que veio em carne para libertar a humanidade.
Nos próximos capítulos, aprofundaremos ainda mais essas evidências, explorando como João e outros escritores do Novo Testamento confirmam, com vigor e coerência, a igualdade do Filho com o Pai em natureza, poder e eternidade.
A personalidade e a divindade do Espírito Santo
O testemunho das Escrituras acerca da personalidade e da divindade do Espírito Santo não é tão extenso quanto o que temos sobre a plena divindade de Cristo. Ainda assim, o que se encontra na Bíblia é profundamente sugestivo — e, diria, persuasivo o bastante para não deixar dúvidas. Um dos testemunhos mais claros aparece em Atos capítulo 5.
Atos 5
A narrativa inicial desse capítulo descreve a experiência trágica de Ananias e Safira. Nos primeiros dias da igreja cristã, muitos fiéis haviam feito votos de consagrar a Deus o valor integral das propriedades que vendessem, a fim de suprir as necessidades da comunidade nascente. O casal, entretanto, decidiu reter secretamente parte do dinheiro, apresentando aos apóstolos apenas uma quantia parcial. Ao mentirem sobre o valor, foram subitamente fulminados diante de todos.
O ponto crucial está na explicação que o apóstolo Pedro dá para o ocorrido: “Então disse Pedro: ‘Ananias, por que encheu Satanás o teu coração, para que mentisses ao Espírito Santo, retendo parte do valor do campo?… Não mentiste aos homens, mas a Deus!’” (At 5:3-4).
Essas palavras são reveladoras. Primeiramente, percebe-se que só se pode mentir a uma pessoa — nunca a uma força impessoal ou a uma coisa inanimada. Mentir implica relação, consciência e moralidade. Podemos “enganar” um sistema, um computador, ou até um animal, mas apenas um ser pessoal, dotado de entendimento e sentimento, pode ser de fato lesado moralmente por uma mentira. Logo, o simples fato de Pedro dizer que Ananias mentiu ao Espírito Santo mostra que o Espírito é um Ser pessoal.
Em seguida, Pedro acrescenta que, ao mentir ao Espírito Santo, Ananias mentiu “a Deus”. A inferência é direta: o Espírito Santo é Deus. Não há outra leitura possível do texto senão essa.
Efésios 4:30
Outra evidência da personalidade do Espírito aparece nas palavras de Paulo: “Não entristeçais o Espírito Santo de Deus, no qual fostes selados para o dia da redenção.” (Ef 4:30).
Novamente, vemos um traço inconfundível de pessoalidade. Um objeto ou energia não pode ser “entristecido”. Entristecer significa causar dor emocional, pesar ou desapontamento — algo que só um ser pessoal, com sentimentos e consciência relacional, pode experimentar. Assim, o Espírito Santo não é uma influência ou mera força divina, mas um Ser divino dotado de emoção e vontade.
A trindade do Deus único
Ao tratarmos desse tema, nos deparamos com um dos maiores mistérios sobre o próprio ser de Deus. Embora possamos vislumbrar reflexos dessa unidade plural em experiências humanas — como o casamento, a amizade e o trabalho conjunto —, nada se compara à realidade trinitária.
Mas qual é, afinal, a evidência de que a Divindade não é apenas unitária, e sim uma pluralidade perfeita de Pessoas divinas unidas em um só propósito?
Mateus 28:19
A passagem mais clara encontra-se na Grande Comissão: “Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo.”
Note-se que Jesus usa “nome” no singular, e não “nomes”. Esse detalhe linguístico é teologicamente profundo: indica que os três compartilham a mesma natureza e caráter. Na Escritura, o “nome” simboliza essência e identidade. Logo, o Pai, o Filho e o Espírito Santo compartilham o mesmo nome, porque são um em caráter, poder e divindade.
Esse mesmo padrão aparece em 2 Coríntios 13:13, onde Paulo encerra sua carta com a bênção trinitária. Tanto na bênção apostólica quanto na fórmula batismal, vemos o reflexo da unidade e da cooperação perfeita das três Pessoas divinas na obra da redenção.
Mateus 3:16-17
Outro episódio revelador é o batismo de Jesus: “Batizado Jesus, saiu logo da água; e eis que se abriram os céus, e viu o Espírito de Deus descendo como pomba sobre Ele. E eis uma voz dos céus, que dizia: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo.”
Nesta cena, os três membros da Divindade estão presentes e atuantes de forma simultânea. O Filho está sendo batizado, o Espírito Santo desce em forma de pomba e o Pai fala desde o céu. Cada um manifesta sua identidade distinta, mas unidos em propósito e missão. A harmonia entre Eles é perfeita, refletindo a unidade essencial da Trindade.
Evidências no Antigo Testamento
A pluralidade dentro da unidade divina não é uma novidade do Novo Testamento. Desde as primeiras páginas da Bíblia, essa verdade já se revela.
Deuteronômio 6:4 e Gênesis 2:24
A célebre Shema de Israel declara: “Ouve, Israel: o Senhor nosso Deus é o único SENHOR.”
A palavra hebraica traduzida como “um” é echad, que expressa unidade composta — uma união que contém diversidade interna. Se Moisés quisesse afirmar que Deus é uma unidade absoluta e indivisível, teria usado o termo yachid, que significa “um” no sentido exclusivo. Contudo, ele escolheu echad, o mesmo termo usado em Gênesis 2:24, quando afirma que homem e mulher “se tornam uma só carne”. Assim, da mesma forma que marido e esposa são dois e, ainda assim, “um”, também Deus é um na comunhão plural das Pessoas divinas.
Gênesis 1:1-3 e 1:26
No relato da criação, encontramos o mesmo conceito. Gênesis 1:1-3 apresenta Deus e o Espírito de Deus atuando conjuntamente, e o Novo Testamento acrescenta que o agente da criação foi o Filho (Jo 1:3; Cl 1:16). Mais adiante, Deus diz: “Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança.”
A forma plural da fala divina revela, mais uma vez, uma comunhão pessoal dentro da própria Divindade. E, ao criar o ser humano “à nossa imagem”, Deus formou também uma unidade plural: homem e mulher, distintos, mas unidos — um reflexo direto do mistério da Trindade.
Reflexões finais
As evidências bíblicas que analisamos confirmam, de maneira coerente e profunda, a divindade de Cristo, a personalidade e divindade do Espírito Santo e a unidade plural da Trindade.
Diante de tais testemunhos, resta a pergunta: essas provas são suficientes para nos levar a reconhecer, com reverência e fé, a realidade de um Deus triúno, pessoal e relacional? Creio que sim.
Mas o estudo não termina aqui. O tema é vasto, e ainda há muitas outras passagens que reforçam essa gloriosa verdade. Em breve, um novo artigo dará continuidade a essa reflexão, apresentando mais evidências e aprofundando o mistério da Triunidade Divina.
Leia também:
A Trindade na Bíblia: O Mistério de Deus em Três Pessoas
A Doutrina da Trindade Foi Criada no Concílio de Nicéia?
A divindade de Cristo e a doutrina da Trindade

