A imortalidade da alma: crença pagã? II

Faixa de seção
A imortalidade da alma

Introdução

A imortalidade da alma é uma crença pagã? A crença milenar na imortalidade da alma parece nunca sair de moda. A mídia, de forma geral, está repleta desse ensinamento, desde superproduções hollywoodianas até desenhos infantis, onde podemos ver claramente essa crença sendo propagada.

Na literatura, encontramos dezenas e dezenas de livros sobre a vida pós-morte, como por exemplo “A Vida Depois da Vida”, de Raymond A. Moody Jr., “Vida Após a Morte”, de Tony Cooke, “Vida no Além”, de Chico Xavier e “Conversando com os Espíritos”, de James Van Praagh. Ao chegarmos ao final da trilha, encontramos a maioria cristã, que também prega e acredita na alma imortal.

Como vimos anteriormente, essa crença se originou da mentira de Satanás “certamente não morrereis” (Gn 3:4), contada a Adão e Eva no jardim, e que posteriormente foi desenvolvida pelas filosofias pagãs e apresentada como “a alma imortal”.

Neste artigo, vamos explorar a perspectiva bíblica sobre a natureza humana, começando, obviamente, pelo relato da criação do homem. É fundamental compreender a visão apresentada na Bíblia para entendermos o que somos.

Você pode ler a primeira parte aqui.

A definição bíblica no Antigo Testamento sobre o que é a alma

Gênesis 2:7 e a “alma vivente”

Se quisermos compreender biblicamente o que é a natureza humana, é necessário nos basearmos no relato da criação do homem em Gênesis 2:7. O texto afirma que “Deus formou o homem do pó da terra e lhe soprou nas narinas o fôlego de vida, tornando-o uma alma vivente”.

Historicamente, a maioria dos estudiosos tem interpretado esse texto sob a compreensão dualística clássica, em que o fôlego de vida seria uma alma imortal e imaterial inserida no corpo mortal. Mas como puderam chegar a essa conclusão, se o texto afirma claramente que “o homem passou a ser uma alma vivente”, em vez de ter uma alma? Há uma diferença crucial entre os verbos ser e ter.

Ademais, é importante ressaltar que as citações que o Antigo Testamento faz à nephesh [alma] não têm nada a ver com uma “fumacinha consciente” que vai para o céu ou inferno após a morte, mas sim se referem à pessoa como um todo, vista de diferentes perspectivas.

Por exemplo, os textos de Nm 5:2; 6:6, 11; 9:6, 7, 10; 19:11, 13; Ag 2:13; Lv 19:28; 21:1, 11; 22:4 falam da pessoa morta como nephesh-alma morta. Isso pode ser uma decepção para aqueles que creem em uma alma imortal. Para os imortalistas, a ideia de uma alma que morre é o cúmulo do absurdo, mas, como se pode ver, é exatamente isso que a Bíblia ensina.

Alma vivente, o que significa?

A crença de que o ser humano tem uma alma imortal levou muitos a interpretar a frase “o homem foi feito alma vivente” (Gn 2:7, ARC) como “o homem obteve uma alma vivente”. É indiscutível o poder dessa crença em reduzir o nível de alfabetização das pessoas, concorda? Felizmente, essa interpretação e outras semelhantes têm sido refutadas por estudiosos sérios que demonstram definitivamente a diferença entre o dualismo grego e a visão holística bíblica da natureza humana.

Por exemplo, o teólogo e professor alemão Hans Walter Wolff, em seu estudo clássico Anthropology of the Old Testament [Antropologia do Antigo Testamento], comentou sobre Gênesis 2:7 da seguinte forma: “O que nephesh [alma] significa aqui? Certamente não alma [no sentido dualístico tradicional]. Nephesh foi projetada para ser vista junto com a forma completa do homem e, principalmente, com sua respiração; além disso, o homem não tem nephesh, ele é nephesh e vive como nephesh.”1

Outro exemplo é o pesquisador católico Dom Wulstan Mork, que em seu livro The Biblical Meaning of Man [O Significado Bíblico do Homem], publicado com o imprimatur católico oficial, escreveu o seguinte: “É a nephesh [alma] que dá vida ao bashar [corpo], mas não como uma substância distinta. Adão não tem nephesh; ele é nephesh, assim como ele é bashar.Ao invés de estar dissociado de seu princípio animador, o corpo constitui a nephesh visível.”2

A definição clara da visão bíblica sobre a natureza humana feita por Mork em seu livro, embora tenha sido publicado com o imprimatur, não afetou a visão dualística tradicional da igreja católica, que se fundamenta na tradição e não na Palavra de Deus.

Recapitulando o que vimos até agora, podemos dizer que a frase “o homem passou a ser nephesh hayyah [alma vivente]” de forma alguma implica que o corpo de Adão foi criado com uma alma imortal que se separa do corpo na hora da morte.

Ao contrário disso, significa que quando Deus soprou o “folego de vida” no corpo inerte, um ser vivo passou a existir, nada mais que isso. O coração começou a bater, o sangue a circular, o cérebro a pensar, os olhos a ver etc. Mais especificamente, “alma vivente” significa “ser vivente”. Portanto, não temos almas, somos almas. A seguir, você verá que o significado bíblico de “alma vivente” se aplica não apenas aos humanos, mas também aos animais.

Animais como “almas viventes”?

É isso mesmo! O fato de a Bíblia usar a mesma expressão para humanos e animais, nephesh hayyah (alma vivente), confirma que “alma vivente” significa “ser vivo”. Na Bíblia Almeida, essa locução aparece pela primeira vez em Gênesis 2:7, no relato sobre a criação de Adão. Mas no original em hebraico — vale lembrar que a Bíblia não foi escrita em português, mas sim em hebraico, aramaico e grego —, bem como na Almeida Corrigida, a mesma expressão é encontrada já em Gênesis 1:20, 21, 24 e 30.

Em todos esses quatro versículos, “nephesh hayyah” se refere aos animais, embora os tradutores da maioria das traduções tenham preferido traduzir por “seres viventes” em vez de “almas viventes”. Mas por quê? Porque estão acostumados a pensar que só os seres humanos têm uma alma imortal e imaterial. O problema é que essa tradução tendenciosa e desorientadora prejudica todos aqueles que não leem em hebraico. Não há defesa para o ato de alterar aquilo que Deus revelou.

Esses versículos mostram de modo inequívoco que nephesh nada tem a ver com uma alma imortal concedida ao homem, mas sim com o princípio anímico de vida ou “fôlego de vida”, presente nos humanos e nos animais. Embora haja uma grande diferença entre os animais e os seres humanos, pois estes foram criados à imagem e semelhança de Deus, isto é, com possibilidades de semelhança com Deus, todos são almas viventes.

Talvez você não aceite essa concepção, ou talvez tenha dificuldades em aceitá-la pelo fato de que o termo aparece 754 vezes na primeira parte da Bíblia e é traduzido de 45 formas diferentes. No entanto, veremos as três principais formas de uso da palavra, o que será suficiente para compreender a visão bíblica sobre a natureza humana.

A alma como pessoa: compreendendo suas necessidades

Em muitas situações de perigo e risco de morte, a Bíblia caracteriza a Nephesh como “homem necessitado”. Uma vez que foi Deus quem fez o homem “alma vivente”, os hebreus, quando em perigo, recorriam a Ele pedindo livramento de suas almas, isto é, de suas vidas. Podemos ver isso claramente em Sl 17:13, onde o salmista diz: “Livra a minha alma [nephesh] do ímpio”.

Em outro salmo, Sl 143:11, o salmista pede a Deus que tire sua alma [nephesh] da tribulação por amor da Tua justiça. Jeremias também expressa sua gratidão a Deus por ter livrado a alma [nephesh] do necessitado das mãos dos malfeitores (Jr 20:13).

Em outro exemplo, Raabe, uma prostituta em Jericó, roga aos espiões israelitas que salvassem sua família e livrassem a alma [nephesh] deles da morte (Js 2:13). Esses exemplos tornam claro que a alma que estava em perigo e precisava de livramento era a vida da pessoa.

A alma enfrentava não apenas perigos de inimigos, mas também de falta de comida. Jeremias lamentou a situação de Jerusalém, dizendo: “Todo o seu povo anda suspirando, buscando o pão; deram as suas coisas mais preciosas em troca de mantimento para refrescarem a alma [nephesh]” (Lm 1:11). Durante a caminhada no deserto em direção à terra prometida, os israelitas reclamavam insatisfeitos por não haver mais carne, como havia no Egito: “Agora, porém, nossa alma [nephesh] está seca, e não vemos nada além deste maná” (Nm 11:6).

Podemos perceber claramente que no Antigo Testamento a palavra “alma” não era vista como um componente imortal da natureza humana, mas sim como a condição incerta e insegura da vida. Em momentos de perigo intenso, os israelitas se lembravam de que eram apenas almas (nephesh) necessitadas, pessoas que dependiam constantemente da proteção e salvação de Deus. Essa visão enfatizava a fragilidade humana e a importância da fé em Deus para a sobrevivência.

Alma como sede das emoções

Um outro aspecto do ser humano que também era chamado de alma no Antigo Testamento é a mente humana.  Referindo-se a Sunamita, encontramos o seguinte em 2 Reis 4:27: “A sua alma [nephesh] nela está triste de amargura”. Também podemos ver Davi clamando ao Senhor para que o livrasse de seus inimigos, dizendo: “A minha alma [nephesh] está profundamente perturbada. […] volta-te, Senhor, e livra aminha alma” (Sl 6:3, 4).

Devido ao fato de que o salmista frequentemente escreveu a partir de experiências de perigo, os salmos contêm expressões como “desfalecia neles a alma” (Sl 107:5), “a minha alma, de tristeza, verte lágrimas” (Sl 119:28), “desfalece-me a alma, aguardando a Tua salvação” (Sl 119:81), “a minha alma suspira e desfalece pelos átrios do Senhor” (Sl 84:2), e “no meio dessas angústias, desfalecia-lhes a alma” (Sl 107:6). Esses versos nos mostram que a alma pode ser compreendida como uma representação da mente e das emoções de uma pessoa.

Como vimos até agora, no Antigo Testamento, a palavra “alma” refere-se à pessoa como um todo, e os aspectos que compõem o ser humano também são denominados de “alma”. Não há nada nos textos que vimos que faça ao menos uma alusão a uma parte imaterial da natureza humana que seja consciente, possua personalidade e possa sobreviver depois da morte.

A alma como o centro da personalidade

A alma não é apenas considerada como a sede das emoções, mas também como a sede da personalidade no Antigo Testamento. Um texto esclarecedor a esse respeito está em Miquéias 6:7: “Darei o meu primogênito pela minha transgressão, o fruto do meu corpo pelo pecado da minha alma [nephesh]?” Ao contrário do que possa parecer, Miquéias não está fazendo um contraste entre o corpo e a alma, ao usar o termo alma a referência continua sendo a pessoa viva.

E essa compreensão não é exclusiva dos adventistas. Por exemplo, o pesquisador católico Dom Wulstan Mork afirmou: “Isso não significa que a alma humana seja a causa do pecado; e o corpo, o instrumento da alma. Em vez disso, a nephesh, a pessoa inteira, é a causa do pecado. Por isso, nesse versículo, a responsabilidade pelo pecado é atribuída à nephesh como pessoa”.3

Essa mesma ideia é encontrada em outros textos que falam sobre culpa e pecado: “Quando uma alma pecar por erro […]” (Lv 4:2); “E, quando alguma alma pecar, […] então, levará a sua iniquidade” (Lv 5:1 KJV); “Mas a alma que fizer alguma coisa atrevidamente […] tal alma será extirpada do meio do seu povo” (Nm 15:30, KJV). “Eis que todas as Almas são minhas; a alma que pecar essa morrerá” (Ez 18:4).

Esses textos mostram claramente que a alma e a pessoa, que pensa, toma decisões e comete pecados, são a mesma coisa. Não existe no Antigo Testamento nenhuma divisão de atividade entre alma e corpo. A alma inclui o corpo. A ideia dicotômica da filosofia grega entre alma e corpo como duas substâncias opostas simplesmente não existe na Bíblia.

A filosofia bíblica nos ensina que tanto o corpo quanto a alma constituem aspectos de um mesmo ser, não sendo possível dissociar um do outro e o ser continuar existindo de alguma forma. Portanto, bashar (corpo) constitui a realidade física da existência humana, enquanto nephesh (alma) é a personalidade da existência humana.

A Alma Diante da Morte

No antigo testamento a sobrevivência da alma está ligada à sobrevivência do corpo pois o corpo é a manifestação exterior da alma. É por isso que a morte de uma pessoa muitas vezes é descrito na bíblia como a morte da alma. Quando a morte atinge o corpo ela atinge a totalidade da alma pois uma parte não pode existir dissociada da outra.

Por isso encontramos declarações como: “matar uma a alma” ou “ferir uma alma” em Nm 31:19; 35:15, 30; Js 23:3, 9. Toda teoria que tenta negar a morte da alma é falsa, porque é dito com todas as letras que a alma morre em Josué 16:30 Números 23:10, que é destruída ou consumida em Ezequiel 22:25, 27 e que expira em Jó 11:20.

Aqueles que leem a Bíblia apenas em português podem discordar da ideia de que a alma morre, já que a palavra “alma” não aparece em todos os textos citados anteriormente. Isso se deve ao fato de que a palavra “nephesh” não é traduzida como “alma” na maioria das versões em português, o que pode levar algumas pessoas a alegarem que o texto se refere à morte do corpo e não da alma. Entretanto, é importante notar que a palavra “nephesh” está presente no texto original em hebraico.

O problema surge porque os tradutores preferiram traduzir a palavra como “pessoa”, presumivelmente por acreditarem que a alma é imortal e, portanto, não pode morrer. Essa posição, no entanto, é antibíblica e desconcertante, já que é desmentida por textos que, mesmo na versão em português, falam claramente sobre a morte da alma. Por exemplo, em Ezequiel 18:19, a passagem afirma que “a alma que pecar, essa morrerá” (cf. Ez 18:4). Esses textos deixam claro que a alma não é imortal e que pode sim morrer.

Não há como escapar, amigo. Na Bíblia, o destino da alma está inextricavelmente ligado ao do corpo e a destruição do corpo é considerada igual à destruição da alma. Qualquer pessoa sincera que procura aceitar aquilo que Deus diz deve aceitar a verdade de que a alma e a pessoa viva são a mesma coisa e, portanto, a alma é mortal.

Jamais a palavra “nephesh” (alma) foi usada para transmitir a ideia de uma entidade imaterial e imortal no Antigo Testamento. Ao contrário, percebemos que na hora da morte, a alma para de funcionar como princípio vital que anima o corpo. Isso ocorre porque o destino da alma está atrelado ao destino do corpo, que é a manifestação visível da alma.

A definição bíblica no Novo Testamento sobre o que é a alma

A visão holística sobre a natureza humana é consistente em toda a Bíblia.  Os escritores do Novo Testamento permaneceram fiéis aos ensinamentos do Antigo Testamento sobre a natureza humana. Por essa razão, o conceito de imortalidade da alma está completamente ausente nos escritos do Novo Testamento. A palavra grega para alma, “psyche”, no Novo Testamento tem o mesmo significado fundamental da palavra hebraica “nefesh” (alma) encontrada no Antigo Testamento. A seguir, veremos alguns textos que exemplificam isso claramente.

Uma alma significa uma pessoa

A palavra “psyche”, que significa alma, é utilizada no Novo Testamento para se referir à pessoa inteira, assim como “nefesh” no Antigo Testamento. Ao ler Atos 2:41, percebemos que, no dia de Pentecostes, “quase 3 mil almas [psyche]” foram batizadas. Obviamente, elas não eram espíritos desencarnados, mas sim pessoas de carne e osso que haviam aceitado a salvação oferecida por Cristo Jesus.

Estevão, por exemplo, ao apresentar sua última defesa perante o sinédrio antes de ser apedrejado, menciona que “setenta e cinco almas [psyche]” da família de Jacó desceram ao Egito, a mesma quantidade de pessoas e o mesmo uso da palavra encontrado no Antigo Testamento (Gn 46:26, 27; Êx 1:5; Dt 10:22). Ao comentar sobre Noé e sua família, Pedro escreveu que “oito almas [psyche] se salvaram pela água” (1 Pedro 3:20).

Esses textos deixam claro que o entendimento que os cristãos do Novo Testamento tinham a respeito da alma não era o mesmo que muitos têm hoje, de uma entidade imaterial que deixa o corpo após a morte. Para eles, a alma e a pessoa eram a mesma coisa.

E, por fim, dentro deste contexto, encontramos a famosa promessa de Cristo em Mateus 11:28, 29: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para a vossa alma.” Ao usar a expressão “descanso para vossa alma”, Cristo está fazendo uma alusão a Jeremias 6:16, onde encontramos a promessa de descanso da alma aos que caminham de acordo com os mandamentos de Deus.

É importante frisar que o descanso que Cristo oferece à alma nada tem a ver com o ensinamento de que, após a morte, a alma se desprende do corpo e sobe para o Pai na glória. Pelo contrário, o descanso que Cristo oferece se dá quando o crente aceita a maravilhosa provisão da salvação — vinde a mim — e vive em conformidade com os princípios de vida que ele ensinou e exemplificou — aprendei de mim.

Entendendo a Alma como Vida

Um dos significados mais comuns da palavra alma, que fornece uma tradução adequada do termo grego “psyche” no Novo Testamento, é “vida”. Um bom exemplo disso pode ser encontrado em Atos 27:22 (cf. 27:10), quando Paulo, no auge de uma tempestade, tranquilizou os membros da tripulação, garantindo-lhes: “nenhuma alma [psyche = vida] se perderá de entre vós, mas somente o navio”. Em versões como a ARA, o termo grego é traduzido corretamente como “vida”, pois Paulo, obviamente, estava falando da perda de vidas.

Outro exemplo esclarecedor pode ser encontrado em Mateus 2:20, que diz: “Levanta-te, toma o menino e sua mãe e vai para a terra de Israel, pois os que procuravam tirar a vida [psyche = vida] do menino já morreram”. Esses textos fazem parte das muitas referências sobre atentados contra a alma, morte da alma e salvamento da alma (psyche).

Todas elas sugerem que a alma não é, de modo nenhum, uma parte imortal da natureza humana, mas sim a própria vida física que pode correr perigo. Em toda a Bíblia, vemos que a sobrevivência da alma está ligada à sobrevivência do corpo. Afinal, alma e pessoa são sinônimos para se referir a um ser humano.

Compreendendo a morte da alma como morte eterna

Compreender o significado amplo do termo alma desfaz muita confusão sobre este assunto. Em Mateus 10:28 (cf. Lc. 12:4), encontramos uma das declarações de Cristo mais mal compreendidas: “Não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma; temei, antes, Aquele que pode fazer perecer no inferno tanto a alma como o corpo”.

Esse é um dos textos que os dualistas mais usam para apoiar a ideia de que a alma é uma substância imaterial e sobrevive após a morte do corpo. No entanto, essa interpretação reflete a concepção dualista da filosofia grega sobre a natureza humana e nada tem a ver com a Bíblia.

Ao examinarmos mais de perto a declaração de Cristo de que devemos “temer aquele que pode fazer perecer no inferno tanto a alma como o corpo”, podemos ver que o próprio verso refuta a teoria de uma alma imortal e imaterial. Pois, se a alma pode ser destruída no fogo do inferno, logo ela não pode ser imortal. Comentando a este respeito, Oscar Cullmann diz: “Ouvimos o próprio Jesus declarar, em Mateus 10:28, que a alma pode ser morta. A alma não é imortal”4.

Portanto, à luz da revelação bíblica sobre a natureza humana, o sentido correto da declaração de Cristo é: não temais aqueles que podem pôr um fim à vossa existência terrena, mas não podem aniquilar a vossa vida eterna em Deus; temei, antes, a Deus, que pode destruir completamente todo o vosso ser eternamente”. Não há nada na declaração de Cristo que possa embasar a crença na imortalidade da alma. Pelo contrário, Cristo ensina que Deus pode destruir tanto a alma quanto o corpo completamente e para sempre.

Conclusão

Em resumo, podemos concluir que a bíblia não endossa a ideia de que a alma é uma entidade imaterial e imortal que sobrevive após a morte do corpo. Tanto no antigo testamento quanto no novo testamento, os termos usados para se referir à alma, como “nephesh” e “psyche”, não sugerem uma consciência que sobrevive à morte do corpo. Pelo contrário, a bíblia apresenta a alma como a pessoa viva, dotada de características únicas, como personalidade, desejos, emoções e capacidades cognitivas.

Portanto, a Bíblia é coerente ao ensinar que a natureza humana é uma unidade indissolúvel. Nessa unidade, corpo, alma e espírito representam diferentes aspectos da mesma pessoa e não diferentes substâncias ou entidades que funcionam de forma independente. Essa visão holística da natureza humana remove qualquer base para a crença na sobrevivência da alma após a morte do corpo.

Nós, adventistas do sétimo dia, defendemos essa visão holística bíblica a respeito da natureza humana, que infelizmente é rejeitada pela maioria das igrejas cristãs. Para nós, é mais importante estar em conformidade com a Palavra de Deus do que adotar crenças populares desprovidas de embasamento bíblico.


Referências

1 WOLFF, Hans Walter. Anthropology of the Old Testament. Philadelphia: Fortress Press, 1974, p.10.

2 MORK, Dom Wulstan. The Biblical Meaning of Man. Londres: Geoffrey Chapman, 1967, p. 34.

3 Ibid., p. 40.

4 CULLMANN, Oscar. “Immortality of the Soul or Ressurrection of the Dead?”. In: STENDAHL, Krister (ed.). Immortality and Ressurrection: Death in the Western World: Two Conflicting Currents of Thought, 1968, p. 36-37.

Leia também:

O que significam as almas debaixo do altar? Apocalipse 6:9-11

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Amós Bailiot

Sou um estudante de História na Universidade Estácio de Sá e um entusiasta em Teologia. Acredito que o conhecimento é valioso apenas quando compartilhado. É por isso que estou aqui, disposto a compartilhar minhas reflexões teológicas. Junte-se a mim nessa jornada!

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Amós Bailiot

Graduando em História pela Universidade Estácio de Sá e estudioso de Teologia, defende a premissa de que o conhecimento se torna verdadeiramente valioso quando compartilhado. Junte-se a mim nessa jornada!

6 comentários

  1. Que o Deus do céu seja louvado por ter revelado as coisas ocultas aos simples, especialmente por mi ter feito parte deste grupo. quanto a ti, meu irmão, muito obrigado por seres uma esferográfica na mão de Deus para escrever estas verdades nos nossos corações.

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